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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Importância do sono

Transcrição:

Destak. 23- 02- 2011.   09.30H. Isabel Stilwell. | Editorial@Destak.pt

Teresa Piava, a maior especialista portuguesa de 'sono' não tem dúvidas em afirmar que os portugueses são o povo que menos dorme da Europa. Nem hesita quando diz que a falta de sono explica a irritabilidade nacional, as dificuldades de raciocínio e memória, e o insucesso escolar. Ah, e justifica, também, por que estamos mais gordos e hipertensos. E afinal, a solução é fácil: levar o sono muito, mas muito mais a sério.

Concluiu que Portugal é um país privado de sono. Porque é que deixámos de dormir tanto como devíamos?
De facto, o actual estilo de vida e as grandes mudanças culturais das últimas décadas em Portugal levaram a uma situação muito preocupante. Basicamente deitamo-nos tarde e acordamos cedo. Na minha juventude, por exemplo, a TV encerrava à meia-noite. E de manhã, os engarrafamentos obrigam a acordar cada vez mais cedo. Para não falar nas novas tecnologias, que não distinguem o dia da noite. Ou seja, as pessoas convenceram-se que não há nem limites nem limitações, aspecto que tem implicações no sono e com a vida em sociedade.

Quais as diferenças para os outros países europeus?

Nos países do Norte da Europa que conheço, como por exemplo a Alemanha, Inglaterra, Holanda, França e países nórdicos, a televisão não inicia programas interessantes às 23h; as crianças e jovens deitam-se muito mais cedo, os centros comerciais tem horários restritos. A noite é mais respeitada. Por isso, embora se queixem de uma restrição do sono, não atinge as nossas proporções.

As consequências desta privação de sono são graves?

Graves e múltiplas: mau rendimento intelectual, mau aproveitamento escolar nos jovens, irritabilidade, problemas de memória e emocionais. Isto no curto prazo, porque a longo há risco acrescido de doenças como hipertensão, diabetes, obesidade, insónia, depressão, cancro da mama, útero e próstata, e claro os acidentes. Um jovem à saída de madrugada de uma discoteca ao fim-de-semana, depois de ter consumido álcool, é uma verdadeira bomba-relógio. Os acidentes de viação e de trabalho têm muitas vezes como causa a falta de horas dormidas.

A obesidade é uma consequência porque enquanto dormimos não vamos ao frigorífico!?!

Também! Mas o que acontece é que no sono há controlo do metabolismo e produção de hormonas que reduzem o apetite. Quando não dormimos, esses mecanismos deixam de funcionar, ou funcionam pior. Já a hipertensão, resulta do aumento matinal do cortisol, que acontece quando há privação de sono.

A falta de sono pode explicar que aspecto da crise?

A irritabilidade geral e o tom desagradável de muitos diálogos; as dificuldades cognitivas e de memória que atrasam o encontrar de soluções (o povo diz, e é verdade, que o travesseiro é bom conselheiro); o ar desgastado e envelhecido nítido de muitas pessoas com cargos dirigentes.

E a crise agrava, por sua vez, a falta de sono. Dormir mal é um dos sintomas da depressão e da ansiedade, não é?

Sim, há muitas pessoas preocupadas com o futuro, frustradas por terem expectativas defraudadas, com problemas concretos de sobrevivência por existirem vários desempregados na família, preocupadas com os filhos que não arranjam emprego, nem têm perspectivas de o arranjar. A insónia e a depressão andam de mãos dadas, isto é, cada uma pode provocar a outra, e pode-se curar uma depressão sem curar a insónia, e vice-versa. Estes factores agravam ainda mais os problemas.

Os últimos números indicam que voltámos a subir no consumo de ansiolíticos e antidepressivos. Que efeito têm sobre o sono, e a qualidade desse sono?

São números expectáveis, dadas as actuais circunstâncias. A grande questão é que esses fármacos têm efeitos nocivos a longo prazo sobre a memória. Encontrar a solução certa para quem sofre de ansiedade ou depressão não é fácil, porque não dormir também é prejudicial. Defendo que o tratamento deva ser muito bem equacionado em termos clínicos e ajustado caso a caso.

Defende que os problemas do sono começam na infância. As nossas crianças precisam de aprender a dormir?

Para mim é muito claro e seguro que sim. Iniciei com a professora Helena Rebelo Pinto um projecto designado 'Sono-Escolas', que tem como objectivo divulgar nas escolas conhecimentos básicos sobre o sono e a sua relação com a saúde, a educação e o comportamento social. Mas que pretende também estruturar um sistema de observação e registo do sono dos alunos, sensibilizar as crianças e os jovens para a importância de dormir bem e para a aquisição de bons hábitos de sono. E ajudar os professores a conseguirem intervir para melhorar o sono dos seus alunos.

E como é que tem sido a adesão das escolas?

Tem sido enorme, com muitos pedidos de acções de esclarecimento e para entrar no projecto em todas as regiões do País. E a imaginação das escolas, dos alunos e dos professores espanta-nos diariamente. Muitas preparam já acções especiais para comemorar o Dia Mundial do Sono, que é a 18 de Março.

Mas que efeitos é que a falta de sono tem na maturação do corpo e do cérebro das crianças e dos adolescentes?

É particularmente nefasta nesta fase, porque é durante o sono que é produzida a hormona do crescimento. Para além disso, o sono é fundamental na organização de memórias e processos cognitivos...

Quem não dorme não aprende, ou aprende menos?

Exactamente, e os pais têm de ter consciência disso. Chegam tarde e querem estar com os filhos, mas depois os filhos acabam por se deitar tardíssimo. Com consequências mais graves do que a birra para acordar de manhã...

A sociedade continua a associar o dormir à preguiça. É quase pecado dizer que se gosta de dormir- porquê?

Há uma tradição cultural ambivalente em muitos aspectos: por um lado diz-se que «quem dorme muito aprende pouco», mas por exemplo Einstein gostava imenso de dormir; depois há a crença de que «deitar cedo e cedo erguer dá saúde e faz crescer», o que está longe de ser verdade...

Isso são óptimas notícias, mas como é que explica a 'culpa' por dormir...

Porque também há uma ambivalência mal sã relativamente à própria noção de prazer, que acaba por ser apresentada de forma equívoca. Deve dizer-se que é tão mau dormir pouco, como dormir demais.

Gosta de dormir?

Gosto de dormir, o que não me tem feito mal nem em termos profissionais, nem em termos de saúde, nem em termos de boa disposição.
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Apneia e ressonar levam a procurar ajuda

Os seus livros são simples e directos. Bom Sono, Boa Vida conta, por exemplo, a história dos problemas de sono de vários tipos de pessoa com que o leitor se pode ir identificando. Recentemente, em parceira com Helena Rebelo Pinto, editou livros para ajudar as crianças a compreender o que é o sono e a sua importância (e de caminho pais e professores). Para lá do seu trabalho clínico, está envolvida em vários projectos nacionais e internacionais nesta área, que pretendem descobrir mais sobre o cérebro dos esquizofrénicos, através da monitorização dos seus ciclos de sono, ou de que forma o sono, e a falta dele, afecta os neurónios dos adolescentes. A apneia do sono é, assim como o ressonar, uma das causas que leva mais doentes ao seu consultório, porque para além do medo de «não acordar», sentem-se cansados, apesar de aparentemente terem «dormido bem».

2 comentários:

jurisdrops disse...

Post fundamental. Mais que necessário refletir sobre os hábitos cotidianos, programar melhor os horários de sono.
Abraços

Fê blue bird disse...

Já tinha pensado em comprar este livro, porque vivo a dormir mal.
Excelentes conselhos!
Obrigada amigo João
Bjos